Diário da Serra
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Primeira enfermeira com paralisia cerebral quer exercer a profissão

Paulo Desidério / Redação DS 14/08/2019 Educação

Bruna Salapata entrou para a história da Unemat

A colação de grau aconteceu dia 8 de agosto

Bruna Salapata entrou para a história da Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat). Após concluir sua jornada de graduação no campus de Tangará da Serra, ela se tornou a primeira pessoa com paralisia cerebral a se formar em enfermagem no país. A colação de grau aconteceu no último dia 08 de agosto, no Centro Cultural Pedro Alberto Tayano.


Em entrevista exclusiva ao DS, a agora enfermeira falou sobre as dificuldades ao longo do caminho e a alegria por ter alcançado o glorioso momento de conclusão do curso.


Subestimada por olhares e até palavras de outras pessoas, ela seguiu em frente e mesmo nos momentos mais frágeis, não desistiu e foi até o fim. Outra barreira foi a questão física. Bruna sofre de dores no quadril. Na reta final do curso, os problemas se agravaram e ela precisou vencer o próprio corpo para concluir seu estágio, parte fundamental da formação.


“Estou aguardando cirurgia na AACD já tem dois anos. Tenho muita dor no quadril e não consigo realizar minhas tarefas diárias. Realizei o estágio com muita dor, mas dei o meu melhor naquele momento. Passava mais tempo no hospital do que em casa. Saía do estágio e ia direto para a Upa. Pensei em desistir, mas meus professores, família e amigos não permitiram”, afirmou.


Bruna frequentou a Associação de Assistência à Criança Deficiente (AACD) em São Paulo. Utilizou as dependências da unidade por um período e, segundo ela, foi o carinho dos funcionários ao longo do tratamento que lhe fez optar por enfermagem, profissão que quer muito exercer.


“Estou procurando um serviço. Pretendo dar continuidade também nos estudos, fazer uma pós em auditoria, enfermagem do trabalho, mestrado e doutorado. Quero muito trabalhar na minha área”, completou, ao deixar mensagem para pessoas que duvidam da própria capacidade de ingressarem e concluírem um curso superior.


“Jamais desista dos seus sonhos. Lute, tenha fé, acredite no seu potencial. Não coloque limite em seus sonhos”, finalizou.


Confira a entrevista completa:
DS: O que você ouvia das pessoas ao frequentar a universidade? 
Bruna: A grande maioria das pessoas diziam coisas positivas ao meu respeito, palavras de incentivo. No entanto, tive que lidar com o preconceito de algumas pessoas durante a minha graduação. Vários momentos me marcaram durante este período de forma positiva e negativamente. Lembro deste dia com muita tristeza mas com ele aprendi uma lição valiosa, pois não importa o que aconteça, a família vai estar sempre ao nosso lado. Este ocorrido aconteceu quando eu estava no 4 semestre. Neste dia, estava esperando o ônibus para ir para a universidade, quando uma mulher chegou, sentou ao meu lado e logo perguntou que curso eu fazia. Eu toda alegre respondi “Enfermagem” e ela me disse logo em seguida “Nossa! Porque você não faz direito ou administração? Eu não quero ser atendida por uma pessoa como você”. Na hora respirei fundo e respondi: “Não tem problema. Se algum dia eu estiver no hospital e a senhora estiver lá chamo outra pessoa para te atender no meu lugar.” Aquele dia fiquei muito mal. Cheguei em casa e chorei muito. Lembro que minha mãe e meus irmãos me disseram “Não se preocupe, pois se não tiver pacientes pra você a gente vai lá e você pode fazer o procedimento que quiser em nós”. Essa fala me fez dar a volta por cima e prosseguir.

DS: Houve dificuldade ao longo desses anos? Qual foi a maior? 
Bruna: Muitas lutas enfrentei durante este período. Sem dúvida foi o último semestre [o de maior dificuldade] por conta da luxação que eu tenho no quadril esquerdo. Estou aguardando cirurgia na AACD já tem dois anos. Tenho muita dor no quadril e não consigo realizar minhas tarefas diárias. Realizei o estágio com muita dor, mas dei o meu melhor naquele momento. Passava mais tempo no hospital do que em casa. Saía do estágio e ia direto para a Upa. Pensei em desistir, mas meus professores, família e amigos não permitiram. Deus colocou anjos em minha vida para me ajudar a superar este momento.

DS: Por que você escolheu enfermagem? 
Bruna: Tudo começou no ano de 2009, quando fiz quatro operações na AACD. Fiquei cinco meses em São Paulo, sendo dois meses e meio no hospital da AACD. Conheci profissionais incríveis na instituição que me inspiraram a seguir nesta profissão. Quando terminei os estudos [Ensino Médio] em 2012, estava decidida a cursar enfermagem neste período. Tive o apoio da minha família e de uma pessoa muito especial, a minha tia Inês Salapata, que faleceu uma semana antes de eu ingressar na Universidade. Esta perda foi bem difícil pra mim, até pensei em não realizar a matrícula. Mas Deus me deu forças para prosseguir. Sempre digo que eu não escolhi a enfermagem, mas sim ela que me escolheu. Sou completamente apaixonada pela minha profissão.

DS: Pretende exercer a profissão? 
Bruna: Sim, pretendo. Inclusive estou procurando um serviço. Pretendo dar continuidade também nos estudos fazer uma pós em auditoria, enfermagem do trabalho, mestrado e doutorado. Quero muito trabalhar na minha área. Sou muito boa no setor do gerenciamento, aprendi muita coisa quando realizei meu estágio supervisionado neste setor, mas pode ser em outros setores. Aprendo rápido as coisas e tenho um bom relacionamento com as pessoas.

DS: Qual a mensagem que você deixa para pessoas que são portadoras de alguma deficiência e sonham em concluir algum curso superior? 
Bruna: Jamais desista dos seus sonhos. Lute, tenha fé, acredite no seu potencial. Não coloque limite em seus sonhos. Gosto muito desta frase do C.S. Lewis: "Dificuldades preparam pessoas comuns para destinos extraordinários”.

 



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