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A morte

Euller Sacramento 04/11/2020 Artigos

A ideia da morte é valorizar a vida. Seja mais intenso, não basta amar é preciso demonstrar

Artigo 'A morte'

Dia 02 de novembro foi dia de Finados, onde pessoas vão visitar ou até mesmo fazer uma oração específica para aqueles que partiram de forma acidental, ou natural. Aos que ficam, restam as dores, a saudade, o carinho e as lembranças.


Neste dia de finados encontrei uma mãe e ela me relatou um pouco da sua história com filho (10 anos). Ela tinha um poder econômico baixo e com isso saia para trabalhar todos os dias as 05 da manhã e voltava apenas as 18 hs e o filho ora ficava com vizinhos, ora com os avós e raramente com o pai.


Sua vida era muito intensa e girava em torno do seu trabalho. Todo dia ao chegar em casa no final do dia, estava exausta, no entanto, dava carinho para o filho, mas havia dias que estava tão cansada que mesmo seu filho querendo carinho ela não conseguia dar, tornando cada vez mais frequente esta cena, o cansaço e a falta de atenção para com ele.


Durante um dia de trabalho desta mãe, ela recebeu uma ligação dizendo que seu filho tinha sido atropelado numa avenida, aquela ligação foi como uma lança em seu coração, pois, a pontada e a dor sentida, até hoje, jamais será esquecida. Após receber a ligação, ela desabou no choro esperando o pior, mas se apegando em Deus para que tivesse sido apenas um susto.


Com o coração acelerado, saiu em disparada do serviço, abandonando todos seus pertences pelo caminho e agarrada a um crucifixo pendurado em seu pescoço. De onde trabalhava até o hospital normalmente levaria 10 minutos, mas aquele dia os 10 minutos pareceram horas.


Ao chegar ao hospital ela não pode ver o filho, pois ele estava na sala de cirurgia, lhe restou apenas a sala de espera que parecia estar mais apertada que seu coração. Enquanto chorava com o crucifixo na mão, lhe passara um filme em sua cabeça. Cenas do filho brincando aos finais de semana, quando chegava em casa cansada e seu filho queria colo, mas estava tão exausta que não conseguia dar o colo e muitas vezes acabava brigando com ele por estar em cima dela, “sai de cima guri” a lembrava.


Começou a  refletir que diante da correria e rotina, seu filho não estava no centro da sua vida e sim o trabalho e mesmo precisando dele ainda assim o colocava acima da sua relação com o filho, pois, aos finais de semana também não ficava com o filho, pois se dizia cansada. Diante de toda esta reflexão na sala de esperava veio a notícia que ela temia: “senhora, seu filho não resistiu e faleceu” e ela desabou ao chão.


Após dois anos a encontrei justamente no dia de finados e me fez esse relato. Qual a finalidade da morte? Por que as pessoas morrem? A única finalidade da morte para quem fica é valorizar a vida, parece clichê, mas pensar na morte te faz valorizar quem está ao seu lado.


Quando você pensa que, quem ama pode morrer a qualquer momento (a morte é certa e sem data) você valoriza mais, ama mais, beija mais, abraça mais, convive mais, é muito mais intenso, para que na falta não venha o peso na consciência e o desejo de ter amado mais, abraçado mais, brincado mais...A ideia da morte é valorizar a vida. Seja mais intenso, não basta amar é preciso demonstrar.

Euller Sacramento é especialista em (re)conectar emocionalmente pais e filhos. Instagram: @eullersacramento



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