Questionário foi aplicado nos 270 alunos dos anos finais na Gentila
Esta semana falaremos sobre a educação – o ensino escolar – em tempo de pandemia. Diferente do que muitos imaginaram em março de 2020, a Covid-19 não foi um evento passageiro; evoluiu para uma quase calamidade, beirando ao colapso dos serviços de saúde, ceifando vidas e deixando sequelas aos infectados que sobreviveram. A sociedade, as relações sociais, as profissões tiveram que se adaptar. Novas atitudes e novos valores foram exigidos pelos organismos de saúde coletiva para evitar uma catástrofe ainda maior.
Um dos setores mais atingidos pelos efeitos da pandemia foi o da educação. Professores, alunos e familiares se viram em uma encruzilhada: como ensinar – aprender – em tempos de pandemia? Brigo para que as aulas voltem ou torço para a pandemia acabar? Outros questionamentos, tanto de educadores quanto de familiares giraram entorno do ensino e da aprendizagem: No ensino à distância – híbrido, online, apostilado – a aprendizagem acontece? Como meu filho estuda? Como ele aprende? Por que meu filho apresenta dificuldade em leitura, escrita, interpretação e operações matemáticas? Por sua vez, o professor se pergunta: o estudante dedica quanto tempo aos estudos? Todas às famílias têm acesso às tecnologias para assistir às web-aulas, acessar links, responder às atividades no google sala de aula? Como explicar um determinado conceito, um raciocínio, através de um vídeo ou de um texto? Como estimular a criação e a criatividade, considerando a atual situação de incertezas? Como crianças e adolescentes estão reagindo ao confinamento, com o medo da morte? Como reagem a necessidade do movimento, do toque, da convivência social, dos grupos? O que pensam? O que sentem? O que fazem?
Com base nestes e outros questionamentos, Rodney Garcia, professor no Centro Municipal de Ensino Gentila Susin Muraro, em Tangará da Serra, elaborou um questionário socioeconômico e emocional para identificar o perfil das turmas do 6º ao 9º do ensino fundamental. Segundo ele, o questionário pretendeu identificar a faixa etária, tamanho da residência, pessoas no mercado de trabalho – formal ou informal –; relações familiares; ocupação do tempo; percepções, sentimentos e emoções em tempo de pandemia.
O questionário foi organizado entorno de questões abertas e fechadas. Mas, mais que respostas objetivas ou subjetivas, lembra o entrevistado, o mesmo fora pensado em diálogo com as competências gerais da educação básica, de modo a contribuir para que o estudante compreenda e ou perceba seus sentimentos, suas emoções e as coisas que lhe foram retiradas, não oportunizadas, em tempo de pandemia.
“O questionário foi o guia orientativo para a produção de texto. Não se tratava de qualquer texto. Eu pretendia que a pessoa, a primeira pessoa, expressasse seus sentimentos, suas emoções, suas percepções sobre o momento vivido. Mais que isso, que o estudante pudesse expressar, revelar-se a si mesmo. Parece ambíguo “revelar-se a si mesmo.” Mas, não é. Através das orientações sobre a construção do texto, muitos estudantes revelaram medos, dores, perdas, angústias, expectativas e faltas”, conta, ao revelar que nas respostas e nas produções de textos, percebeu muitos adolescentes apreensivos, chateados em decorrência do confinamento; desejosos de convivência escolar e social.
Dos quase 270 alunos matriculados nos anos finais, aproximadamente 50% produziu o texto.
“A maioria admite que estudar em casa é complicado. E esse sentimento é legítimo, pois, em casa, antes dos estudos, vem os afazeres domésticos, os cuidados com irmãos, sobrinhos e, em alguns casos, até de avós. Além dos cuidados com a casa afazeres, os momentos de distração giram entorno das redes sociais, para os que tem acesso à internet, TV e, em alguns casos, brincadeiras com amigos. Houve respostas preocupantes, como o do tipo: tenho medo das coisas que penso”, revela.
Para além dos números, fora observado esforço, empenho, esperança. E até pedido de ajuda. “Observamos em alguns textos manifestações do tipo “pensei em fazer uma besteira,” “Para mim está sendo muito difícil!” “Tenho medo de perder meus familiares,” “Meus irmãos e eu brigamos muito.” Vi a esperança na ciência, quando muitos adolescentes pediam pela vacinação em massa. Houve muitas manifestações religiosas, do tipo “Se Deus quiser”.
Das produções lidas, o professor revela ainda que quatro chamaram a atenção. São três textos de estudantes do 8º ano e um do 7º ano. “Esses quatro estudantes surpreenderam pela qualidade das produções. Talvez, necessitando expressar, verbalizar, materializaram em suas produções os fantasmas e as esperanças que povoam o universo adolescente neste tempo de incertezas”.