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A Rede Invisível que Sustenta

Euller Sacramento 06/03/2025 Artigos

É curioso como a ausência momentânea de um filho pode causar um estranhamento profundo. Na clínica, vejo isso o tempo todo

A Rede Invisível que Sustenta

No feriado de Carnaval, minha filha viajou para outra cidade para passar alguns dias com os avós e os tios. A casa, que normalmente pulsa com sua energia, de repente ficou silenciosa. Tudo pareceu desacelerar. As refeições foram mais tranquilas, a rotina menos corrida.

No começo, aproveitei essa pausa. Mas, em algum momento, senti um nó estranho no peito. Era como se houvesse algo errado em estar relaxado.

É curioso como a ausência momentânea de um filho pode causar um estranhamento profundo. Na clínica, vejo isso o tempo todo. Quando uma mãe deixa o filho com sua rede de apoio – seja com os avós, tios, amigos ou até uma babá de confiança – muitas vezes se vê perdida.

Ela passa anos moldando sua vida em torno da criança. Cuida, protege, ampara. Até que, por algumas horas ou dias, o filho não está ali. E, ao invés de se permitir aproveitar esse momento, o que vem? A culpa.

Culpa por estar descansando enquanto toma um café quente, sem pressa. Culpa por estar rindo de uma série que gosta, sem interrupções. Culpa por sair com amigos e, por um instante, esquecer do relógio. Culpa por dormir uma noite inteira sem se preocupar com choros ou demandas. Culpa por simplesmente se sentir leve.

Mas aqui está algo que ninguém nos ensina direito: você pode e deve se permitir relaxar e se divertir sem seu filho por perto. Principalmente quando você tem uma rede de apoio segura, onde sabe que ele está bem física e emocionalmente. Isso não significa que você o ama menos. Significa apenas que você também precisa existir além da maternidade.

A rede de apoio é um privilégio. Sim, nem todos a têm, e isso precisa ser reconhecido. Mas, quando se tem, deve ser valorizada, não sabotada pela culpa.

E não é apenas a mãe que se beneficia desse suporte. A criança também precisa dessa convivência ampliada. Ter outras referências afetivas, aprender que há amor e cuidado além dos pais, sentir-se segura com outras pessoas. Isso fortalece seu desenvolvimento emocional.

Então, se você tem uma rede de apoio, agradeça. E, mais do que isso, permita-se usá-la sem culpa. Sua saúde mental agradece, e seu filho, ao crescer, aprenderá que mães e pais também são pessoas, que merecem descanso, lazer e vida própria.


Euller Sacramento é Psicólogo Clínico.
Instagram: @eullersacramento

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