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A casa de pedras e as paredes de concreto

Leonilda Alves Ribeiro 19/11/2020 Artigos

Sua busca pelo autoconhecimento estreia na família, mas pode permear por toda eternidade

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A escrita surgiu dos inúmeros desenhos expressos pelo homem nas paredes das cavernas. Após ser cravada em pedras milenares, ela saltou rumo a evolução com a humanidade. Passe o tempo que passar, a linguagem sempre que voltar ao passado terá sua moradia reservada nas inúmeras casas de pedras existentes na história. Nos labirintos destes paredões da vida, surgiu a família sendo desenhada aos poucos nas mentes e nos corações humanos de geração em geração.  


Na Grécia antiga, por exemplo, a família era patriarcal, sendo o pai o chefe, ser de autoridade suprema. Á mulher cabia tão somente a submissão total, inclusive para sair de casa e penetrar nos olhares alheios deveria ter permissão. Abrindo a porta da era medieval nos deparamos com Philippe Ariès, dizendo que o importante no passado, até o século XVII, era manter uma vida totalmente pública, ou seja, não havia lugar para uma vida privada. Um verdadeiro império das aparentes perfeições em grupo moldava a sociedade.


Ao sobrevoar tais narrativas percebe-se que o frenesi coletivo do mundo moderno muito se iguala ao modelo de vida do período medieval e toma a consciência das pessoas. O homem vive preso às paredes de concreto que criou para si. Veste os valores da vaidade, lança mão de toda sua privacidade a fim de demonstrar possuir uma vida impecável. O lugar da dama neste cenário é diferente, uma vez que ela conquistou seu direito de ser “livre”. Na esfera familiar é quase sempre ativa e semeia diálogos entre os membros.


O grande filósofo Sócrates disse “conhece a ti mesmo, e conhecerás todo o universo e os deuses”. Nesta valsa filosófica procuramos saber quem somos, mesmo sabendo que a resposta está lá, na base familiar. Nas lágrimas amparadas pela doçura da mãe ou na força e autoridade do pai. No tripé: amor, paciência e autoridade. Mas se a família é o alicerce da nossa vida afetiva e psíquica, por que sofrer tanto?


Nos atiramos em penhascos emocionais destrutivos, assistimos ao preconceito com naturalidade, aceitamos o bullying social que julga a partir de padrões injustos. Tudo isso vendo a vida passar diante dos olhos. O tempo caminha e permanecemos lá assistindo, imóveis, calados, presos mais uma vez em nossa parede de concreto chamada corpo. Em certos instantes ele grita, as mãos suam, a razão vai devagarinho se desfazendo na face pálida, resta agora o devir...


A família é um encontro de vidas que possibilita uma experiência fantástica, uma vez que desenha nossa forma de olhar a realidade de dentro para fora. Ao sair de casa para abraçar o mundo, pode-se ser surpreendido por uma pessoa que consideramos mágica, simplesmente porque ela é sua outra metade. Neste cenário você deixa de ser invisível para o mundo, esta pessoa te enxerga além da superfície - ela contempla sua essência. Podem dizer que se trata de sorte ou coincidência. Eu chamo de encontro de almas. Sua busca pelo autoconhecimento estreia na família, mas pode permear por toda eternidade.

Leonilda Alves Ribeiro é Pedagoga, Especialista em Psicopedagogia Institucional e Clínica. Atualmente atua na Sala de Recursos Multifuncional da E E Professor João Batista, em Tangará da Serra-MT. leozinhaadryan@gmail.com

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