Essa crise não é só sobre envelhecer. É sobre a dor de um processo que a sociedade insiste em tornar mais difícil: o de reescrevermos nossa identidade em meio às expectativas e cobranças externas
Na semana passada, em conversa com alguém especial, ela comentou que lia meus artigos e sugeriu que eu escrevesse sobre a crise dos 50 anos. Com um olhar carregado de emoções, desabafou que, ao atingir essa fase, passou a sentir-se deslocada: “Meu corpo já não é o mesmo, minhas roupas não se encaixam… me sinto errada por usar algo que julgo não ser ‘para a minha idade’. Para mim, os 50 anos são algo totalmente novo.”
Esta idade chega como um território desconhecido. Por um lado, carregamos o passado – a juventude, o corpo vigoroso, as roupas que pareciam feitas sob medida para cada momento, a energia infinita que tornava cada festa eterna. Por outro lado, olhamos para o futuro e vemos as possibilidades, mas também os limites impostos pelo tempo. Quem sou agora, se não sou mais quem fui?
Essa crise não é só sobre envelhecer. É sobre a dor de um processo que a sociedade insiste em tornar mais difícil: o de reescrevermos nossa identidade em meio às expectativas e cobranças externas. Aos 50, espera-se que sejamos “maduros”, “comportados”, “adequados”. Mas o que é adequado? E para quem?
Esta conversa me mostrou que, aos 50, ainda estamos descobrindo coisas pela primeira vez. Não importa o que digam, a ideia de que “a vida começa aos 30” ou “é plena aos 40” são apenas generalizações. A vida recomeça quantas vezes forem necessárias. Recomeça aos 50, aos 60, aos 70. Recomeça cada vez que decidimos parar de buscar a validação dos outros e escolhemos nos olhar com afeto.
O corpo muda, sim. Ele carrega as marcas de uma jornada vivida. As roupas podem não ser mais as mesmas, mas o que determina o que devemos ou não vestir? Essa inquietação não deveria ser sobre a roupa em si, mas sobre o que faz você se sentir confortável, bonita, viva. Quem definiu que a juventude tem exclusividade sobre a beleza? Não seria justamente a maturidade – com suas histórias, suas conquistas, suas cicatrizes – o que nos torna mais interessantes e únicos?
É normal sentir saudade de quem fomos, mas é igualmente importante acolher quem estamos nos tornando. Talvez os 50 anos sejam, na verdade, uma chance de começar de novo. Uma oportunidade de vestir não apenas a roupa que gosta, mas a pele de quem você escolhe ser. Porque, no final, não há crise que resista a uma alma que se permita florescer novamente.