A sala de parto do Hospital Municipal terá seu nome eternizado
Maria Biasoli Rodrigues nasceu em Ituverava, em São Paulo, aos sete dias do mês de dezembro de 1925. Estudou até o terceiro ano e casou-se com 24 anos com Júlio Rodrigues, que tinha a mesma idade, após se conhecerem em uma festa na região em que moravam. Diante da forma antiga, o namoro foi rápido e cerca de oito meses depois de casaram.
Logo em seguida se mudaram para Paranavaí, no Paraná. Ali trabalhavam na terra plantando frutas e erva-doce, que vendiam para sustentar a família que já crescia. Nesse local Maria passou um dos maiores medos, quando a filha Irene, de apenas três anos, desapareceu, sendo encontrada muito tempo depois no meio de um pasto sendo cheirada pelo gado.
“Saiu caminhando com uma boneca e uma cachorrinha”,
conta a filha Elena, lembrando o desespero da mãe que buscou pela filha até embaixo da ponte. Ali nasceram os filhos: José Luiz Rodrigues, Nairdo Rodrigues, Elena Rodrigues, Irene Rodrigues, Osmar Rodrigues, Vanildo Rodrigues.
Atrás de prosperidade e ouvindo falar que em Tangará da Serra ‘arrastava dinheiro com rastelo’, o esposo decide mudar-se para o Mato Grosso.
“Ele endoidou e vendeu nossa chácara maravilhosa e viemos”,
narra Elena, ao lembrar que quando chegaram à Barra do Bugres a ponte havia caído. Por isso, a família ficou acampada à beira da estrada se alimentando apenas de goiabas.
“Minha mãe chorava demais”,
comenta.
Ao chegarem em Nova Olímpia, Maria ficou doente e o diagnóstico era de água no pulmão, sendo levada para ser internada em Barra do Bugres. Os filhos ficaram, e, graças a bondade de estranhos, foram cuidados. No Município uma senhora conhecida por Rosa, que era dona de uma pensão, deu um casebre para a família se alojar.
“Ficamos em casa e essa senhora nos olhava e com ela ficou o irmão caçula”.
Internada ficou cerca de uma semana e no Município ficaram por oito meses até sua completa recuperação.
No ano de 1961 rumam para Tangará da Serra, mas a serra era uma barreira difícil de transpor e, ali ficaram por muitos dias porque o caminhão não conseguia subir devido a mesma ser íngreme em demasia.
“Subia um pouquinho e quebrava, daí ficávamos ali. Meu pai fazia uma fogueira e tomava uma cachacinha com um amigo que vinha com a gente e eles dormiam embaixo do caminhão. Minha mãe chorava a noite quase toda de medo das onças comerem eles e nos ficávamos ali com ela na carroceria, em um colchão, todos com as cabeças no colo dela”,
relata a filha.
Após vários dias, que Elena não consegue precisar, o caminhão foi arrastado e chegaram ao lugarejo no qual o pai trabalharia na serralheria de seu José Aderaldo, pelos lados da Rua 19.
“Meu pai fez uma casinha de casqueiros embaixo de uma lona e ficamos ali”.
Os dias seguiam e a família enfrentava dificuldades, inclusive, para se alimentar.
“O meu pai tinha que sair daqui a pé e ir à Nova Olímpia comprar comida para a gente não morrer de fome”.
Segundo a narradora dos fatos, o irmão caçula morreu por ter passado por falta de algumas coisas.
A vida foi seguindo e Maria às voltas com os filhos que ganharam aqui mais um irmão, Leonirdo Rodrigues, que assim como os outros foi pego pela mãe. Trabalhava em casa, mas descobriu aqui seu dom de parteira, sendo a primeira de Tangará da Serra. Seu primeiro parto foi aos 16 anos de idade, quando ficou de companhia com uma irmã de quem foi forçada a fazer o parto.
Ao chegar em Tangará da Serra, a precariedade na área da Saúde era extrema, Maria deu de frente com uma mulher grávida que estava em trabalho de parto e não viu outra coisa a fazer, senão ajudar. A criança foi natimorta e ela mesma enterrou nas proximidades do Memorial dos Pioneiros.
“Ela foi longe com uma enxada e enterrou essa menininha”.
Passado algum tempo fez outro parto e assim acabou ganhando fama, que muitas mulheres a buscavam durante a gestação para fazerem um ‘pré natal’, em que eram orientadas em chás e banhos pela parteira que já tinha, inclusive, partos agendados. Conforme foi ficando conhecida, ganhou um apelido carinhoso de Maria Cinturão, em virtude de um cinto grosso que usava na cintura.
A família não consegue precisar quantas crianças nasceram pelas mãos de Maria que, por não ter estudo, marcava os nascimentos de meninas com ‘bolinha’ e meninos com ‘bolinha e um x’.
Há época da suposta malária, ajudou imensamente nos cuidados com os doentes.
Com o dinheiro da chácara vendida no Paraná a família comprou uma chácara na Vila Goiás, depois se mudaram para outro sítio próximo a Unidade de Pronto Atendimento (UPA), aonde a família plantava amendoim e arroz. Ali ajudava na lida da terra quando não tinha partos a serem feitos.
A vida não foi nada fácil, mas seguiu firme e lutou bastante com o marido, que faleceu em 2003 de um câncer no esôfago.
Apesar de todas as intempéries, Maria completou 89 anos de idade lúcida e independente, e fazia questão de não depender de ninguém, tanto que se casou mais duas vezes após o falecimento de Júlio. Com o segundo esposo viveu um ano e ele faleceu, já com o terceiro, quando passou assinar ‘Silva’ viveu até sua partida.
A morte foi em decorrência de um tombo ocorrido dias antes, mas o problema somente foi diagnosticado após um segundo tombo que a levou ao hospital, aonde foi constatado algumas costelas estavam quebradas. Já o exame apontou que apenas duas costelas estavam intactas e por esse motivo, o pulmão havia sido perfurado. Maria tinha sido diagnosticada com Osteoporose anteriormente, o que prejudicou o processo de recuperação.
Na UTI ficou por 17 dias e partiu no dia 1 de junho de 2015 deixando 23 netos, 39 bisnetos e 13 tataranetos.
Em reconhecimento aos imensos serviços prestados ao Município de Tangará da Serra, recebeu carta de boa parteira, título de Cidadã Benemérita, e também consagrada madrinha de muitos cidadãos tangaraenses.
Ainda teve a aprovação do Legislativo para que a sala de parto do Hospital Municipal Arlete Daisy Cichetti de Brito, tenha seu nome eternizado. A homenagem à pioneira foi proposta pela vereadora e presidente da Câmara Municipal, Elaine Antunes.