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Jauir Borges da Silva – O sanfoneiro que alegrava as festas de Tangará da Serra e Santo Reis

Rosi Oliveira / Especial DS 14/10/2024 Memória

Era o único entre dez irmãos violeiros que tocava sanfona

Memória

Jauir Borges da Silva – O sanfoneiro que alegrava as festas de Tangará da Serra e Santo Reis

De uma família numerosa, Jauir Borges da Silva nasceu em 28 de agosto de 1949 e desde muito cedo já se destacava. Quarto filho do casal Ana Teixeira Borges e Erotides Francisco da Silva, que lidavam na terra e tiveram 14 filhos dos quais somente 10 vingaram, nasceu e cresceu cercado pela família que sempre foi muito unida.

Ao lado dos irmãos João, Jairo, Jaime, Juarez, Jonas, Erotides, Evânio e Ana Maria, em Caçu no Estado de Goiás, aprontou as peraltices de criança e algumas delas na fase adulta também. Jauir estudou até a quarta série e somente não levou os estudos adiante porque tinha que trabalhar.

“Ele contava para nós que o vô dizia que tinha que trabalhar e não estudar, e no final, o dinheiro era entregue nas mãos do pai dele. O sistema era muito diferente”,

relata a filha Lucélia.

Segundo os filhos era muito festeiro e namorador e tinha na família, em sua grande maioria, tocadores de violão, o que possibilitava que as festas surgissem rapidinho.

“Todos os meus tios eram muito festeiros e tocam violão, só papai tocava sanfona”,

relata a filha.

“Era uma família muito animada e as farras eram na casa do meu avô na rua 10, era muita festa e muita folia”.

Jauir casou-se duas vezes. A primeira esposa foi Cilene Maria de Souza. Os dois se conheceram na casa de um primo onde a moça estava trabalhando. Cilene havia perdido a mãe e o pai havia se casado novamente, o que acabou por deixar um clima desconfortável e, por esse motivo, ainda com 13 anos saiu de casa.

  • O namoro durou pouco tempo e do casamento nasceram:
    • Lucélia Borges da Silva, Gilson Borges da Silva, Jailson Borges da Silva e Lucilene Patrícia da Silva, adotada pelo casal.

Como a fama corre, a família ouve falar de Tangará da Serra e dois tios vem conhecer o local afamado em 1976. Tempos depois todos vieram, no mesmo ano.

“Viemos todos em cima do caminhão e parava na beira dos rios para fazer comida”.

Em Tangará da Serra a família foi morar em uma casinha de pau a pique de chão batido, no Córrego Russo, onde plantava fumo.

“Ele trabalhava doído”.

Firmou amizades e sempre era chamado para festas nas quais era o sanfoneiro oficial.

Em 1985, Sebastião Oliveira (Tatão) havia formado um grupo de Folia de Santos Reis e Jauir foi convidado pelo seu irmão para tocar no grupo, pois afinal ele era um sanfoneiro ‘dos bons’. Nas épocas de política, ele fazia parcerias junto de seu irmão Jonas, que também era do grupo e compunham ‘jingles’ de propaganda política. Entre deles os de Dona Thais, Zé Amando e também para o Tuim quando se candidatou a Deputado.

Com o Grupo de Reis Estrela do Oriente tocou Folia de Reis por aproximadamente 20 anos, gravou junto com seu irmão em 2005 um CD com 12 toadas de Folia de Reis. Com seu acordeom levou o nome de Tangará da Serra para muitos lugares do Brasil. Às vezes tocava em Nova Olímpia, mas a grande maioria foi em Tangará da Serra e região. Além de dar segurança na hora da apresentação, o Jauir, o Borges como era conhecido, fazia arranjos maravilhosos durante suas andanças.

Depois de um tempo muraram-se para o pé da Serra Tapirapuã onde viram muitos acidentes em virtude do local ser de difícil trafegabilidade.

Após alguns anos a família se muda para Tangará da Serra novamente, e, desta vez, para a cidade, quando passou a trabalhar no corte de cana na Itamarati.

Uma segunda oportunidade de ser feliz

No ano de 1987 o casal se separa e Jauir muda-se para Cuiabá onde trabalhava de vigia. Dali se mudou para uma fazenda e ali conheceu a segunda esposa, que foi roubada, um hábito frequente há época.

“Era no Garimpo Jatobá onde eles se conheceram. Ela tinha 15 anos e o pai dela era muito bravo e não queria o namoro. Benedita Cigana da Silva tinha 15 anos e ao olhar para a moça já disse que iria roubá-la. Depois disso ficou sabendo que o pai havia dado uma surra na moça de seus encantos o que o fez ficar mais certo da decisão. Eu fui até ela e disse que o pai queria casar com ela e ela disse que iria”.

No dia e hora marcados, nada da amada aparecer e então, Jauir teve que tomar uma decisão.

“Deu o tempo e ela não vinha, ele foi lá e por um buraquinho pegou uma varinha e cutucou ela que levantou e o seguiu”,

narra um dos filhos.

Os dois andaram quilômetros fugindo e voltaram tempos depois. Cabe salientar que dias depois o outro irmão de Jauir roubou a irmã de Benedita.

Um ano depois chega o primeiro filho do casal, Thiago Santos Silva, depois Gustavo Diego Santos Silva e Marcelo Borges Santos Silva.

Jauir mudava-se com frequência e passou por diversos lugares.

Com o passar dos anos passou a fazer uso demasiado da bebida, mas isso não apagava seu lado brincalhão e carinhoso com os filhos e esposa.

“O papai sempre foi muito ligado a nós, muito carinhoso e amoroso com a gente”, relatam os filhos que estavam quase todos no dia de contar sua história para o Memória, tamanho é o amor que sustentam pelo patriarca. “Era calmo, de muita conversa”.

Apesar das muitas mudanças, Jauir não se desligava de Tangará da Serra e fazia questão de estar com os filhos.

“Meu pai não fazia planos, vivia o hoje, não tinha miséria”,

recordam, ao serem unânimes em relatar que Jaiur não guardava os sentimentos para si.

“Meu pai falava eu te amo com muita facilidade”.

A família guarda muitas histórias de Jaiur, inclusive, quando nos bailes ele apagava as lamparinas, o que gerava muita bagunça.

Ao narrar a história, os filhos e noras transformaram o momento em uma diversão sem igual. Jauir foi lembrado com muita alegria e risos altos em sua homenagem.

Um inimigo morando junto sem fazer barulho (a doença)

Era forte, saudável e apesar da bebida mantinha-se muito bem até que teve que passar por uma cirurgia de hérnia pela segunda vez.

Dessa cirurgia foi necessário fazer uma tomografia que pegou um pedacinho do pulmão que acendeu o alerta no médico que o acompanhava no tratamento.

“Ele pediu para a gente investigar, que tinha algo errado”.

A família iniciou as investigações e apesar de todos acharem que seria algo ligado ao cigarro, que era de seus vícios desde os nove anos de idade, a resposta foi de câncer de pulmão que acabou silenciando o sanfoneiro.

“Fizemos todos os exames e levamos ele para Hospital de Câncer. Ali, ao ver os exames, o médico deu o diagnóstico de ‘terminal’, sem ver meu pai que estava em outro quarto, mas ao ver Jauir decidiu fazer o tratamento devido a sua condição que era boa. Ele apresentava apenas falta de ar, estava com uma aparência boa apesar da doença”,

relembra a filha Lucélia.

Apesar das quimioterapias e das radioterapias a doença não regrediu e além disso, a família, durante o tratamento, descobriu também que ele tinha hanseníase.

Jauir faleceu 60 dias após a descoberta da doença, em 26 de junho de 2022, aos 72 anos.

“Ele morreu sem saber. Podia pressentir, mas da nossa boca nunca ouviu nada”.

Ficou internado em Cuiabá e partiu como queria, cercado dos seus.

“Todos os parentes vieram e nós fazíamos vigília do lado de fora e ele teve a oportunidade de ter todos ali se revezando. A nossa família mostrou para ele a união em vida e na hora da partida também”.

Como homenagem por sua vida e contribuição com Tangará da Serra por suas mãos e de seus descendentes, foi homenageado pela vereadora Elaine Antunes que deu seu nome a Rua 70 do bairro Tarumã, que passa ao lado da Vila Olímpica e em frente a antiga Casa do Adolescente.



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